terça-feira, 10 de abril de 2018

Reunião de Condomínio é Fatal!


Aluguei um apartamento de quarto-e-sala na Tijuca, perto do morro do Borel, ou seja, a cinco minutos a pé de um local onde eu tenho bastante trabalho. O valor do aluguel era baixo, o do condomínio era menor ainda, e eu podia apanhar o pessoal que morria de bala perdida sem sair de casa, só esticando a mão pela janela. Perfeito para mim. Mas, como eu disse, não deu muito certo.


Conviver com traficantes, tiroteios constantes e pessoas morrendo feito moscas é moleza. Duro mesmo é aguentar reunião de condomínio. A única e última da qual participei foi uma experiência tão desagradável que fiquei com vontade de ME mandar para o inferno. Só não fui por medo de encontrar outra reunião de condomínio por lá.

Foi em um salãozinho de festas mequetrefe do prédio, com pouco mais de meia-dúzia de pessoas e sem ar-condicionado. Comecei a me sentir otário já ali, só por ter ido. A sensação de tempo perdido em uma reunião de condomínio foi semelhante a que eu tive durante o dilúvio, quando fiquei 40 dias e 40 noites coçando o saco esperando a água baixar pra começar a trabalhar de novo.

O encontro começou com o síndico lendo a ata da reunião anterior. Um saco. Depois começou-se a discutir algumas reformas no sistema de esgoto, falou-se sobre crianças que depredavam o playground, sobre o cheiro ruim da lixeira do quinto andar, sobre o salário de um zé-mané que fazia tudo… Aquilo parecia tão INTERMINÁVEL que fez os 12 bilhões de anos de formação do Sistema Solar, que eu presenciei em pé, parecer um pulinho na padaria. Mas mal sabia eu que o pior estava por vir: as reclamações. A coisa fedeu pro meu lado.

Uma das moradoras, uma gordinha com cara de fofoqueira se levantou e disse, me olhando meio de lado, que depois que “certas pessoas” se mudaram para lá, tudo andava muito esquisito. Todo mundo olhou para mim, claro. Entendi a indireta, mas fiquei na minha, não passei o recibo.

Outro me acusou de entrar e sair do prédio pelo menos umas dez mil vezes por dia e que não suportava o barulho de abrir e fechar do portão. Eu me defendi dizendo que precisava sair para trabalhar essas dez mil vezes, até mais em caso de dia que tem alguma catástrofe por aí, e que ninguém não tinha nada a ver com a minha vida! Começamos a bater boca ali, barraco geral, o síndico pediu silêncio e nos acalmamos. Alguém até me trouxe um copo d’agua.

O momento de calmaria durou pouco, um sujeito de camiseta regata e bermudão começou a me detonar outra vez dizendo que me flagrou dentro do apartamento dele perto da sua avó de 96 anos. E eu disse que só estava fazendo uma pesquisa de mercado no prédio, só conferindo o endereço caso eu tivesse que levá-la uma hora ou outra, na semana que vem para ser mais exato. Pra quê! A discussão voltou geral, ofensa pra todo lado.

Até que uma mulher de bobs no cabelo pediu a atenção e reclamou que desde que eu havia chegado lá TODOS os animais de estimação do prédio haviam morrido. Como eu explicava isso? Olhei para cima, fingi que não era comigo. Mas todo mundo sabe que odeio bichos e qualquer um que tenha um yorkshire que late às três da manhã merecia morrer também. Eu até que PEGUEI LEVE.

A reunião descambou para todo mundo me perguntando sobre várias outras mortes que ocorreram por ali. Eu expliquei que a vida é assim, que às vezes prefiro trabalhar perto de casa, e que num condomínio grande daqueles qualquer um poderia morrer de uma hora pra outra, principalmente ao lado do Borel! Mesmo contrariado, o pessoal concordou. De algumas verdades não dá pra fugir.

Completei dizendo que ali era uma área perigosa, que uma bala perdida poderia atingir qualquer um a qualquer momento, como atingiu o seu Tino do 512. Todos ficaram surpresos “O Seu Tino morreu? Mas onde é que está o corpo?”. Eu suspirei e disse “Sabe o cheiro ruim da lixeira do quinto andar? Pois é, o problema NÃO É a lixeira”. Todos saíram correndo para resolver o assunto e me deixaram sozinho.

Fui embora dali pra nunca mais voltar. Levei comigo a certeza de que se o diabo fosse esperto patentearia esse troço, se é que a idéia já não foi dele. Qualquer dia eu ligo só pra perguntar.

Diário da Foice, 05 de fevereiro de 2010


Fonte: Diário da Foice - WordPress

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