Mostrando postagens com marcador musica. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador musica. Mostrar todas as postagens

domingo, 9 de novembro de 2008

Drama da Angélica

Drama da Angélica (toada, 1943) - Alvarenga e M. G. Barreto

Ouve meu cântico / Quase sem ritmo
E a voz de um tísico / Magro e esquelético
Poesia ética / Em forma esdrúxula
Feita sem métrica / Com rima rápida.

Amei Angélica / Mulher anêmica
De cores pálidas / E gestos tímidos
Era maligna / E tinha ímpetos
De fazer cócegas / No meu esôfago.

Em noite frígida / Fomos ao lírico
Ouvir o músico / Pianista célebre
Soprava o zéfiro / Ventinho úmido
E então Angélica / Ficou asmática.

Fomos ao médico / De muita clínica
Com muita prática / E preço módico
Depois do inquérito / Descobre o clínico
Um mal atávico / Mal sifilítico.

Mandou-me célere / Comprar noz-vômica
E ácido cítrico / Para o seu fígado
E o farmacêutico / Mocinho estúpido
Errou na fórmula / Fez de propósito.

Não teve escrúpulo / Deu-me sem rótulo
Ácido fênico / E ácido prússico
Corri mui lépido / Mais de um quilômetro
Num bonde elétrico / De força múltipla.

O dia cálido / Deixou-me tépido
Achei Angélica / Já toda trêmula
A terapêutica / Dose alopática
Lhe dei em xícaras / De ferro ágape.

Tomou num fôlego / Triste e bucólica
Essa estrambólica / Droga fatídica
Caiu no esôfago / Deixou-a lívida
Dando-lhe cólica / E morte trágica.

O pai de Angélica / Chefe do tráfego
Homem carnívoro / Ficou perplexo
Por ser estrábico / Usava óculos
Um vidro côncavo / E outro convexo.

Morreu Angélica / De um modo lúgubre
Moléstia crônica / Levou-a ao túmulo
Foi feita autópsia / E todos os médicos
Foram unânimes / No diagnóstico.

Fiz um sarcófago / Assaz artístico
Todo de mármore / Na cor do ébano
E sobre o túmulo / Uma estatística
Coisa metódica / Como os Lusíadas.

E numa lápide / Paralelepípedo
Pus este dístico / Terno e simbólico
Cá jaz Angélica / Moça hiperbólica
Beleza helênica / Morreu de cólica !....

domingo, 2 de novembro de 2008

Valsinha Macabra

Romance de uma Caveira (valsa humorística, 1940) - Alvarenga, Ranchinho e Chiquinho Sales

Eram duas caveiras que se amava / e à meia-noite se encontrava pelo cemitério os dois passeava / e juras de amor então trocava.

Sentado os dois / em riba da lousa fria a caveira apaixonada / assim dizia que pelo caveiro de amor morria / e ele de amores por ela vivia.


Ao longe uma coruja cantava alegre / de ver os dois caveiro assim feliz / e quando se beijavam em tom fúnebre / a coruja batendo as asa pedia bis.



Mas um dia chegou de "pé junto" / um cadáver, um defunto /
E a caveira pr' ele se apaixonou / e o caveiro antigo abandonou.

O caveiro tomou uma bebedeira / e matou-se de modo romanesco /

por causa dessa ingrata caveira / que trocou ele por um defunto fresco.

Soturna Cantiga

Perdão, Emília (modinha, 1889)
- José Henrique da Silva e Juca Pedaço

Paraguassu


Já tudo dorme, vem a noite em meio, a turva lua se surgindo além: / Tudo é silêncio; só se vê nas campas, piar o mocho no cruel desdém. / Depois, um vulto de roupagem preta, no cemitério com vagar entrou. / Junto ao sepulcro, se curvando a medo, com triste frase nesta voz falou:

"Perdão, Emília, se roubei-te a vida, se fui impuro, fui cruel, ousado... / Perdão, Emília, se manchei teus lábios. / Perdão, Emília, para um desgraçado." / "Monstro tirano, por que vens agora, lembrar-me as mágoas que por ti passei? / Lá nesse mundo em que vivi chorando, desde o instante em que te vi e amei.

Chegou a hora de tomar vingança, mas tu, ingrato, não terás perdão... / Deus não perdoa as tuas culpas todas, / Castigo justo tu terás, então. / Perdi as flores da capela virgem, / Cedi ao crime, que perdão não tinha, mas, tu, manchaste a minha vida honesta, / Depois, zombaste da fraqueza minha...

Ai, quantas vezes, aos meus pés, curvado, davas-me prova de teu puro amor. / Quando eu julgava que fosses um anjo, não via fundo nesse olhar traidor. / Mas vês agora, que o corpo em terra tombou, de chofre, sobre a lousa fria."

E quando a hora despontou, na lousa um corpo inerte a dormitar se via: / "Perdão, Emília, se manchei-te a vida, se fui impuro, fui cruel, ousado... / Perdão, Emília, se manchei teus lábios. / Perdão, Emília, para um desgraçado."....


Primeira modinha gravada em 1902 pela Casa Edison. Almirante no programa "O Pessoal da Velha Guarda" de 13 de março de 1952 afirmava: "Entre as velhas e mais plangentes modinhas do Brasil figura a célebre “Perdão Emília”, soturna cantiga que foi [flor?] pelo Brasil afora no tempo das serenatas. Jamais se apurou quem a escreveu. Aproveitando-se dessas circunstâncias, um cantor paulista apossou-se dela, gravando-a em discos com o seu nome. É uma desfaçatez, que foi uma nódoa na decência da profissão de autores e de cantores nessa terra.

“Perdão Emília”, segundo informação de antigos ouvintes, informações a que dão curso sem apoiar ou desapoiar, foi composta por um português chamado José Henrique da Silva, que residiu longo tempo em São João da Barra. Foi escrita há 63 anos, em 1889, quando o seu autor contava 24 anos de idade. Isso, repito, é a informação de um ouvinte que nos deu por carta, e que jamais pudemos apurar."