No
estúdio de William H. Mumler, os milagres aconteciam. Os abastados
membros da sociedade norte-americana podiam tirar uma fotografia na
companhia dos fantasmas dos entes queridos. Só Mumler possuía a
capacidade mediúnica de fotografar os espíritos – e foi graças a esta
maravilhosa competência que ganhou fama e muito dinheiro.
Na década de 1860 nunca faltaram
mortos para Mumler fotografar. Só a guerra civil americana – a chamada
Guerra da Secessão, ocorrida entre 1861 e 1865 – fizera desaparecer três
por cento da população americana: 970 mil pessoas, dos quais 618 mil
eram soldados.
A guerra não era a única a
devastar o coração dos vivos: não existiam condições sanitárias para
grande parte da população, havia muita doença e a Medicina era
insuficiente. Morriam muitos antes de tempo, principalmente crianças.
O Espiritismo – de uma forma
simplificada, a crença segundo a qual é possível estabelecer contacto
com os mortos e conhecer pormenores sobre o Além – tinha ocupado a mente
do grande público a partir de 1850, com as célebres sessões espíritas
mediúnicas das irmãs Fox. Trinta e oito anos depois, a 21 de Outubro de
1888, uma das irmãs, Margaret, admitiu as fraudes e explicou os truques
numa confissão escrita para o New York World, mas a maioria dos crentes
considera que Margaret Fox mentiu ou foi forçada a mentir.
Mumler sempre estivera
interessado em fazer experiências com uma nova e intrigante tecnologia –
a fotografia. Tinha 29 anos quando notou que uma anterior exposição
tinha permanecido na placa reveladora, provocando acidentalmente uma
dupla exposição de fotos, ou seja, a sobreposição de duas figuras na
imagem. Viu-se então a si próprio na companhia do sujeito feminino da
foto anterior. Mostrou-a a amigos, garantindo que a figura esbatida era o
espectro de uma prima já falecida.
Encorajado pela reação crédula
que obteve, levou-a a um especialista em Espiritismo – este caiu que nem
um patinho. Em breve, a foto corria as publicações espíritas
americanas, bem como cartões de visita distribuídos em Boston com uma
reprodução do retrato de Mumler na companhia da Além-prima. E Mumler
acabou por deixar a profissão de joalheiro para se dedicar ao lucrativo
negócio dos fantasmas fotogénicos.
O que deu verdadeira notoriedade
a William H. Mumler foi a visita ao seu estúdio de uma misteriosa
senhora de negro que se veio a saber mais tarde ser a ex-primeira-dama
Mary Todd Lincoln, viúva do presidente Abraham Lincoln.
Mary Todd era uma conhecida
participante de sessões espíritas e a cruel tragédia da sua vida
contribuíra para que procurasse no Além o consolo que não conseguia
encontrar no mundo terreno: o filho Edward Baker Lincoln, nascido em
1846, morreu aos quatro anos, vítima de cancro medular da tiróide; o
filho William Wallace, nascido em 1850, morreu de febre tifóide aos 11; a
15 de Abril de 1865, o marido foi assassinado; cinco anos depois perdia
o terceiro filho, Ted, levado pela tuberculose aos 18. O único que ela
não viu morrer foi o quarto filho, Robert Tod.
Mary Todd tinha problemas
psicológicos graves – os primeiros sinais surgiram após a morte do filho
William. Os sintomas de esquizofrenia agravaram-se com o tempo e a
ex-primeira dama chegou a ficar internada num hospital psiquiátrico.
Foi portanto a esta senhora
doente e fragilizada pela tragédia que Mumler revelou um assombroso
retrato onde o fantasma do falecido marido a consolava das suas perdas.
Muitos outros notáveis se seguiram, incluindo o editor Moses A. Dow, da
Waverley Magazine, que se deixou fotografar na companhia do espírito de
uma antiga assistente pessoal.
Os problemas na carreira de
William Mumler começaram quando se descobriu que alguns dos rostos
convenientemente desvanecidos dos mortos pertenciam a pessoas que ainda
estavam vivas. E a situação piorou quando começou a circular a suspeita
de que o fotógrafo dos espíritos tinha por hábito arrombar as casas de
alguns dos seus clientes à procura de fotos que pudesse sobrepor.
Finalmente, em fins de Março de
1869, já com estúdio montado em Nova Iorque, William foi detido pela
polícia sob a acusação de fraude. O julgamento foi um dos acontecimentos
mais mediáticos da época, com dezenas de jornalistas de todo o país
destacados para cobrir o acontecimento. Dezenas de fotógrafos
testemunharam em tribunal, mostrando ao juiz como a fraude podia ser
feita através da dupla exposição dos retratos. Dezenas de testemunhas
também foram a tribunal defender a idoneidade de Mumler, sobretudo os
seus clientes, gratos pela possibilidade de se reunirem com os queridos
mortos através de uma fotografia.
O juiz acabou por determinar que
as provas apresentadas pela acusação não eram suficientes para o acusar
de fraude, mas também deu a entender que pessoalmente considerava
Mumler um vigarista. Mumler foi libertado, abandonou Nova Iorque e
regressou a Boston, escreveu uma autobiografia na qual nunca assumiu a
marosca, mas a sua reputação sofreu um rombo extraordinário e ele nunca
mais conseguiu retomar a sua carreira de fotógrafo do Além. Morreu na
miséria. E depois disso nunca mais se deixou fotografar.
Fontes: BITAITES in "The Ghost and Mr. Mumler | The Strange Case of William Mumler | The Mumler Mystery"
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