Em 1888, foi nomeada professora numa freguesia de Socorro (Santo Amaro), Dona Joaquina, que para ali se mudou, levando em sua companhia a irmã e o filho desta, seu sobrinho Artur, e meu pai, que contava então 8 anos, e era tratado na intimidade pelo tradicional apelido baiano de Ioiô.
Meu pai é muito conhecido na Bahia. Tem dois filhos residentes aqui no Rio, e foi ele o principal protagonista do fato verídico que aqui relato.
Aproximam-se os festejos de Nossa Senhora do Socorro, e a professora encomenda um vestido a certa modista que morava num arraial distante, de nome São Paulo.
Era véspera da festa, e nada do vestido chegar. Notando a preocupação de sua tia, que se lamentava de não ter um portador para ir buscar a encomenda, Ioiô ofereceu-se. Não era tanto pelo serviço que iria prestar, mas pelo prazer de ir cavalgando a "Mineira", mula que sempre desejara montar...
Entretanto, só a muito custo, depois de pedir com enorme insistência, Ioiô conseguiu de sua tia a almejada licença. E pelas seis horas da tarde, tomava a estrada em direção ao arraial. O prazer que lhe causava o passeio fez com que nem se arreceasse de atravessar o enorme bambuzal que lhe surgiu a meio caminho.
Em casa da modista foi informado de que o vestido não estava pronto, e Ioiô empenhou-se para que a costureira o terminasse o quanto antes, a fim de que pudesse regressar com alguma luz.
Só às 20 horas, porém, o vestido ficou pronto e o menino imediatamente pôs-se a caminho de volta.
Seguiu estrada afora, num trote picado, mas, já agora, tomado de preocupação, devido ao adiantamento da hora...
Tudo correu bem até o lugar chamado Catiúba, quando sua atenção foi despertada por um assovio muito forte, vindo da mata.
O menino sentiu um arrepio percorrer-lhe o corpo e apertou ainda mais o trote da mula.
Viajou assim mais alguns instantes, quando um novo assovio, mais forte e mais próximo, se fez ouvir. Logo a seguir sentiu que alguém trepara na garupa do animal que, ao sentir o peso estranho, estremeceu violentamente, desandando em galope mais veloz ainda.
Adiante, um terceiro silvo... Dessa vez a mula manifestou tamanho susto que desembestou tentando desviar-se da estrada, embrenhando-se pela mataria.
Para manter o animal na estrada, assim como para lhe imprimir mais velocidade, Ioiô lhe dava lambadas violentas, atirando o chicote por cima da cabeça, no intuito de atingir o personagem que sentia colado às suas costas.
Cada vez mais o menino sentia crescer sua assombro, porque ao invés de atingir o personagem na garupa, seu chicote fustigava em seu próprio corpo pelas costas...
Felizmente, pouco além, o animal foi dar uma cancela da fazendola de um senhor chamado Macário, que, achando-se providencialmente por perto, acudiu a socorrer o menino puxando a mula pela rédea. Lá chegando, o menino nem pode apear, quase desfalecido como estava, pedindo, com voz apavorada, que o deixassem no escuro, pois tinha medo de luz!
Com a lufa-lufa causada por sua chegada, naquele estado, ninguém se lembrou da mula, que ficou defronte da porta. Somente Macário, num hábito muito comum no interior, em dado momento, tirou-lhe os arreios e os deixou de lado, certo de que "Mineira", por instinto, se encaminharia para a cocheira ou o pasto, a fim de passar a noite.
No dia seguinte, logo cedo, ao sair para a missa, passando pela residência da professora, Macário foi encontrar a mula parada, em pé, na mesma posição em que a deixara na véspera. Admirado, gritou para o interior da casa:
- Professora, essa mula ainda não saiu daqui?
Enquanto ninguém acudia, o fazendeiro, intrigado com a absoluta imobilidade do animal, pôs-se a observá-lo de perto. Parecia uma estátua, olhos parados.
Então, a fim de tirá-la daquela estranha paralisação, Macário encostou-lhe um dedo. Foi a conta: a mula estateou-se no chão.
Estava morta.
Fonte: Urbanics - Contos de Terror
Meu pai é muito conhecido na Bahia. Tem dois filhos residentes aqui no Rio, e foi ele o principal protagonista do fato verídico que aqui relato.
Aproximam-se os festejos de Nossa Senhora do Socorro, e a professora encomenda um vestido a certa modista que morava num arraial distante, de nome São Paulo.
Era véspera da festa, e nada do vestido chegar. Notando a preocupação de sua tia, que se lamentava de não ter um portador para ir buscar a encomenda, Ioiô ofereceu-se. Não era tanto pelo serviço que iria prestar, mas pelo prazer de ir cavalgando a "Mineira", mula que sempre desejara montar...
Entretanto, só a muito custo, depois de pedir com enorme insistência, Ioiô conseguiu de sua tia a almejada licença. E pelas seis horas da tarde, tomava a estrada em direção ao arraial. O prazer que lhe causava o passeio fez com que nem se arreceasse de atravessar o enorme bambuzal que lhe surgiu a meio caminho.
Em casa da modista foi informado de que o vestido não estava pronto, e Ioiô empenhou-se para que a costureira o terminasse o quanto antes, a fim de que pudesse regressar com alguma luz.
Só às 20 horas, porém, o vestido ficou pronto e o menino imediatamente pôs-se a caminho de volta.
Seguiu estrada afora, num trote picado, mas, já agora, tomado de preocupação, devido ao adiantamento da hora...
Tudo correu bem até o lugar chamado Catiúba, quando sua atenção foi despertada por um assovio muito forte, vindo da mata.
O menino sentiu um arrepio percorrer-lhe o corpo e apertou ainda mais o trote da mula.
Viajou assim mais alguns instantes, quando um novo assovio, mais forte e mais próximo, se fez ouvir. Logo a seguir sentiu que alguém trepara na garupa do animal que, ao sentir o peso estranho, estremeceu violentamente, desandando em galope mais veloz ainda.
Adiante, um terceiro silvo... Dessa vez a mula manifestou tamanho susto que desembestou tentando desviar-se da estrada, embrenhando-se pela mataria.
Para manter o animal na estrada, assim como para lhe imprimir mais velocidade, Ioiô lhe dava lambadas violentas, atirando o chicote por cima da cabeça, no intuito de atingir o personagem que sentia colado às suas costas.
Cada vez mais o menino sentia crescer sua assombro, porque ao invés de atingir o personagem na garupa, seu chicote fustigava em seu próprio corpo pelas costas...
Felizmente, pouco além, o animal foi dar uma cancela da fazendola de um senhor chamado Macário, que, achando-se providencialmente por perto, acudiu a socorrer o menino puxando a mula pela rédea. Lá chegando, o menino nem pode apear, quase desfalecido como estava, pedindo, com voz apavorada, que o deixassem no escuro, pois tinha medo de luz!
Com a lufa-lufa causada por sua chegada, naquele estado, ninguém se lembrou da mula, que ficou defronte da porta. Somente Macário, num hábito muito comum no interior, em dado momento, tirou-lhe os arreios e os deixou de lado, certo de que "Mineira", por instinto, se encaminharia para a cocheira ou o pasto, a fim de passar a noite.
No dia seguinte, logo cedo, ao sair para a missa, passando pela residência da professora, Macário foi encontrar a mula parada, em pé, na mesma posição em que a deixara na véspera. Admirado, gritou para o interior da casa:
- Professora, essa mula ainda não saiu daqui?
Enquanto ninguém acudia, o fazendeiro, intrigado com a absoluta imobilidade do animal, pôs-se a observá-lo de perto. Parecia uma estátua, olhos parados.
Então, a fim de tirá-la daquela estranha paralisação, Macário encostou-lhe um dedo. Foi a conta: a mula estateou-se no chão.
Estava morta.
Fonte: Urbanics - Contos de Terror
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