sábado, 23 de abril de 2016

A Caixa


O pacote foi deixado ao lado da porta da frente: um cubo de papelão fechado com fita adesiva, nome e endereço escritos à mão: SR. E SRA. ARTHUR LEWIS, 217 E. 37th Street, Nova York, Nova York 10016.

Norma recolheu o pacote, abriu a porta e entrou no apartamento. A noite estava caindo.

Depois que colocou as costeletas de cordeiro para assar, preparou para si mesma um drinque e sentou-se para abrir o pacote.

Dentro dele havia uma pequena caixa de madeira equipada com um botão de comando. Esse botão era protegido por uma redoma de vidro.

Norma tentou levantá-la, mas estava firmemente presa. Ao virar a caixa ao contrário, viu um pedaço de papel dobrado, preso ao fundo dela. Ela o puxou: "O Sr. Steward vai se apresentar a vocês às oito da noite".

Norma colocou a caixa ao lado dela no sofá. Tomou um gole da bebida e releu o bilhete datilografado, sorrindo.

Alguns momentos depois, voltou para a cozinha para preparar a salada.

A campainha tocou às oito horas.

— Eu atendo — gritou Norma da cozinha.

Arthur estava lendo na sala de estar.

Havia um homem baixo no corredor. Ele tirou o chapéu quando Norma abriu a porta. — Sra. Lewis? — ele perguntou educadamente.

— Sim?

— Sou o Sr. Steward.

— Oh, sim — Norma reprimiu um sorriso, pois tinha certeza agora de que se tratava de uma estratégia de vendas.

— Posso entrar? — perguntou o Sr. Steward.

— Estou bastante ocupada — disse Norma. — Mas vou pegar o seu objeto misterioso. Começou a se virar.

— Você não quer saber o que é?

Norma voltou. O tom do Sr. Steward havia sido ofensivo.

— Não, não quero — disse ela.

— Poderia ser muito valioso — disse ele.

— Monetariamente? — disse ela, em tom de desafio.

Steward assentiu:

— Monetariamente — disse ele.

Norma franziu a testa. Não gostava da atitude do visitante.

— O que você está tentando vender? — perguntou ela.

— Não estou vendendo nada — respondeu ele.

Arthur veio da sala.

— Algo errado?

O Sr. Steward se apresentou.

— Ah, aquele treco — apontou para a sala e sorriu.

— O que é aquilo, afinal?

— A explicação não vai tomar muito do seu tempo — respondeu o Sr. Steward. — Posso entrar?

— Se estiver vendendo alguma coisa... — disse Arthur.

Steward balançou a cabeça.

— Não estou.

Arthur olhou para Norma.

— Você que sabe — ela disse.

Ele hesitou.

— Bem, por que não? — respondeu ele.

Entraram na sala e Steward sentou-se na poltrona de Norma. Ele mexeu nos bolsos e retirou um pequeno envelope lacrado.

— Aqui dentro está a chave para abrir a redoma que protege o botão — disse ele, colocando o envelope na mesinha ao lado da poltrona. — Esse botão está conectado ao nosso escritório.

— Para que serve? — perguntou Arthur.

— Se você apertar o botão — disse Steward —, em algum lugar do mundo, alguém que você não conhece morrerá. Em troca, vai receber um pagamento de cinquenta mil dólares.

Norma olhou atônita para o homenzinho. Ele estava sorrindo.

— Do que está falando? — Arthur lhe perguntou.

O Sr. Steward pareceu surpreso:

— Mas eu acabei de lhes explicar — disse ele.

— Isto é uma pegadinha? — perguntou Arthur.

— De jeito nenhum. A oferta é completamente genuína.

— Mas não faz sentido! — Arthur insistiu. — Você quer que acreditemos que...

— Quem você representa? — quis saber Norma.

O Sr. Steward pareceu embaraçado.

— Receio que não esteja autorizado a lhe revelar — disse ele. — Entretanto, asseguro-lhe de que a organização é de âmbito internacional.

— Acho melhor o senhor ir embora — disse Artur, levantando-se. O Sr. Steward também se pôs de pé.

— Claro.

— E leve a caixa.

— Tem certeza de que não gostaria de pensar no assunto por um ou dois dias?

Arthur apanhou a caixa e o envelope e meteu-os com vigor nas mãos do visitante. Em seguida, atravessou o cômodo e abriu a porta.

— Vou deixar o meu cartão — afirmou o Sr. Steward.

Ele o depositou na mesa ao lado da porta. Quando foi embora, Arthur rasgou-o ao meio e atirou os pedaços sobre a mesa.

— Meu Deus! — exclamou.

Norma ainda estava sentada no sofá.

— O que você acha que foi isso? — perguntou ela.

— Não sei nem quero saber — respondeu ele.

Ela tentou sorrir, mas não conseguiu.

— Você não está nem um pouco curioso?

— Não — ele balançou a cabeça.

Depois que Arthur retomou seu livro, Norma voltou para a cozinha e acabou de lavar os pratos.

— Por que você não quer falar sobre isso? — Norma perguntou mais tarde.

Arthur, que escovava os dentes, levantou a vista e olhou a imagem de sua esposa refletida no espelho do banheiro.

— Isso não o deixa intrigado?

— Isso me ofende — respondeu Artur.

— Eu sei, mas... — Norma enrolou outro bobe no cabelo — isso também não o deixa intrigado?

Ao entrarem no quarto, ela perguntou:

— Você acha que é uma pegadinha?

— Se for, é de muito mau gosto.

Norma sentou-se na cama e tirou os chinelos.

— Talvez seja algum tipo de investigação psicológica.

Arthur deu de ombros.

— Pode ser.

— Talvez algum milionário excêntrico esteja por trás disso.

— Talvez.

— Não gostaria de saber?

Arthur sacudiu a cabeça.

— Por quê?

— Porque é imoral — disse ele.

Norma deslizou para debaixo das cobertas.

— Bem, eu acho que é intrigante — disse ela.

Arthur desligou a luz e se inclinou para beijá-la.

— Boa noite — disse Arthur.

— Boa noite — ela lhe deu um tapinha nas costas.

Norma fechou os olhos. Cinquenta mil dólares, pensou.

NA MANHÃ SEGUINTE, quando saía de casa, Norma viu as metades do cartão sobre a mesa. Por impulso, guardou-as na bolsa. Trancou a porta e juntou-se a Arthur no elevador.

Enquanto estava na sua pausa para o café, pegou novamente as metades do cartão na bolsa e segurou-as unindo-as. Só havia o nome do Sr. Steward e um número de telefone impressos no cartão.

Após o almoço, pegou novamente as metades do cartão na bolsa e as emendou com fita adesiva. Por que estou fazendo isso?, perguntou-se.

Pouco antes das cinco da tarde, discou o número.

— Boa tarde — disse a voz do Sr. Steward.

Norma quase desligou, mas conteve-se. Limpou a garganta.

— Aqui é a Sra. Lewis — disse ela.

— Sim, Sra. Lewis.

O Sr. Steward parecia deliciado.

— Estou curiosa.

— E natural — disse o Sr. Steward.

— Não que eu acredite em uma só palavra do que o senhor nos disse.

— Oh, mas é a mais pura verdade — respondeu o Sr. Steward.

— Bem, seja lá como for... — respondeu Norma. — Quando você disse que alguém no mundo iria morrer, o que quis dizer?

— Exatamente isso — confirmou ele. — Poderia ser qualquer pessoa. Tudo que garantimos é que você não a conhece. E, é claro, você não teria de vê-la morrer.

— Por cinquenta mil dólares — disse Norma.

— Isso mesmo.

Ela fez um som de escárnio.

— Isso é loucura.

— No entanto, essa é a proposta — disse Steward. — Gostaria que eu lhe devolvesse a caixa?

Norma retesou-se.

— Claro que não — ela desligou com raiva.

O PACOTE FOI DEIXADO ao lado da porta da frente; Norma o viu quando saiu do elevador. Ai, que irritante!, pensou. Olhou para a caixa enquanto abria a porta.

Simplesmente, não vou apanhá-la, disse consigo mesma. Entrou e começou a preparar o jantar.

Mais tarde, levou sua bebida para a sala de estar. Abrindo a porta, pegou o pacote e o levou até a cozinha, deixando-o sobre a mesa.

Ficou sentada na sala, tomando seu drinque e olhando pela janela.

Depois de algum tempo, voltou para a cozinha para virar as costeletas na grelha. Ela colocou o pacote em um armário baixo, com a intenção de jogá-lo fora no dia seguinte, pela manhã.

— Talvez algum milionário excêntrico esteja brincando com as pessoas – disse ela. Arthur olhou-a por cima de seu jantar.

— Eu não entendo você.

— O que quis dizer?

— Esqueça isso — disse ele.

Norma comia em silêncio. De repente, largou o garfo.

— Suponha que seja uma oferta genuína — disse.

Arthur encarou-a.

— Suponha que seja uma oferta genuína.

— Tudo bem, vamos supor que seja! — ele parecia incrédulo. — O que você gostaria de fazer? Receber a caixa de volta e apertar o botão? Assassinar alguém?

Norma olhou-o ultrajada:

— Assassinar...

— Como você definiria isso?

— Se você nem ao menos conhece a pessoa? — perguntou Norma.

Arthur olhou espantado.

— Você está dizendo o que eu acho que está?

— E se for um velho camponês chinês a milhares de quilômetros de distância daqui? Algum nativo doente no Congo?

— Que tal um menininho na Pensilvânia? — Arthur rebateu. — Uma linda garotinha no outro quarteirão?

— Agora você está exagerando.

— A questão, Norma — continuou ele —, é que não importa quem você mata: ainda será assassinato.

— A questão é — Norma o interrompeu —, se for alguém que você nunca viu na vida e nunca vai ver, alguém cuja morte você nem tomaria conhecimento, ainda assim não apertaria o botão?

Arthur olhou para ela, chocado.

— Quer dizer que você faria? — Cinquenta mil dólares, Arthur.

— O que a quantia tem a ver...

— Cinquenta mil dólares, Arthur — Norma o interrompeu. — Uma chance de fazer aquela viagem para a Europa de que sempre falamos.

— Norma, não.

— Uma chance de comprar a casa de campo que sonhamos.

— Norma, não — seu rosto estava lívido. — Pelo amor de Deus, não!

Ela estremeceu.

— Tudo bem, calma — disse ela. — Por que você está tão chateado? É só uma conversa.

Após o jantar, Arthur foi para a sala de estar. Antes de sair da mesa, ele disse:

— Prefiro não discutir mais isso, se você não se importa.

Norma deu de ombros. — Por mim, tudo bem.

ELA SE LEVANTOU MAIS CEDO que o habitual para fazer panquecas, ovos e bacon para o café da manhã de Arthur.

— O que estamos comemorando? — perguntou ele com um sorriso.

— Nada em especial — Norma pareceu ofendida. — Eu quis fazer isso, é tudo.

— Bom — disse ele —, estou feliz que você tenha feito.

Ela tornou a encher sua xícara.

— Quis mostrar que eu não sou... — ela deu de ombros.

— Não é o quê?

— Egoísta.

— Eu disse que você era?

— Bem... — ela fez um gesto vago. — Na noite passada...

Arthur nada disse.

— Toda aquela conversa sobre o botão — disse Norma. — Acho que você me interpretou mal.

— Como assim? — disse ele, na defensiva.

— Acho que você sentiu — ela gesticulou novamente — que eu só estava pensando em mim mesma.

— Oh.

— Eu não estava.

— Norma.

— Bem, não estava. Quando eu falei sobre a Europa, a casa de campo...

— Norma, por que estamos nos envolvendo tanto nisso?

— Eu não estou nem um pouco envolvida — sua respiração estava entrecortada. — Estou simplesmente tentando mostrar que...

— O quê?

— Que eu gostaria que fôssemos à Europa. Gostaria que tivéssemos um apartamento mais confortável, móveis melhores, boas roupas. Que pudéssemos, finalmente, ter um bebê.

— Teremos, Norma — disse ele.

— Quando?

Ele olhou para ela com desânimo.

— Norma...

— Quando?

Ele pareceu recuar um pouco:

— Você está mesmo dizendo...?

— Estou dizendo que eles provavelmente estão fazendo isso para algum projeto de pesquisa! — ela o interrompeu. — Querem saber o que pessoas comuns fariam em tal circunstância! Estão apenas dizendo que alguém iria morrer para estudar as reações, para ver se não haveria culpa, ansiedade, sei lá! Você não acha realmente que eles vão matar alguém, não é?

Arthur não respondeu. Ela notou as mãos dele trêmulas. Depois de algum tempo, ele se levantou e saiu. Quando ele saiu para trabalhar, Norma permaneceu à mesa, olhando para o seu café. Vou me atrasar, pensou. Deu de ombros. Que diferença faz?

De qualquer modo, o lugar dela deveria ser em casa e não trabalhando em um escritório.

Enquanto empilhava os pratos, virou-se abruptamente, enxugou as mãos e apanhou o pacote no armário de baixo. Abriu-o e colocou a caixa sobre a mesa. Contemplou-a por um longo tempo, antes de retirar a chave do envelope e abrir a redoma de vidro. Olhou para o botão. Que ridículo, pensou. Tudo isso por causa de um botão sem sentido.

Inclinou-se e o pressionou. Por nós, pensou com raiva.

Ela estremeceu. Será que estava mesmo acontecendo? Um arrepio de horror a percorreu.

Num instante, já havia passado. Fez um ruído de desprezo. Ridículo, pensou. Tanto barulho por nada.

HAVIA ACABADO DE PREPARAR os bifes para o jantar e servia-se de outra dose de bebida quando o telefone tocou. Ela o atendeu.

— Alô?

— Sra. Lewis?

— Sim?

— Aqui é do Hospital Lenox Hill.

Ela mal conseguiu acreditar quando a voz lhe relatou o acidente no metrô, o empurra empurra da multidão. Arthur fora empurrado da plataforma na frente do trem. Tinha consciência de estar balançando a cabeça, mas não conseguia parar.

Quando desligou, lembrou-se de que o seguro de vida de Arthur pagava 25 mil dólares em caso de morte natural e... 50 mil em caso de morte acidental.

— Não.

Não conseguia respirar. Esforçou-se para se levantar e caminhou até a cozinha em estado de choque. Algo gelado pressionou seu crânio quando ela retirou a caixa do lixo.

Não havia pregos ou parafusos visíveis. Não dava para ver como fora montada.

De repente, começou a esmagá-la na beirada da pia, batendo cada vez mais forte até a madeira se despedaçar. Ela arrancou as laterais, cortando os dedos, sem perceber. Não havia transistores na caixa, nem fios, nem transmissores.

A caixa estava vazia.

Ela virou-se assustada quando o telefone tocou. Atravessando a sala aos tropeções, tirou o fone do gancho.

— Sra. Lewis? — perguntou o Sr. Steward.

Não era a voz dela gritando daquela maneira, não podia ser.

— Você disse que eu não conhecia a pessoa que iria morrer!

— Minha cara senhora — disse o Sr. Steward —, realmente crê que conhecia o seu marido?


"O Incrível Homem que Encolheu: e Outras Histórias" - Richard Matheson - Osasco, SP - Novo Século Editora, 2010.

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